30º Desabafo – 25 de Abril de 2007 – Dias de Romaria

Quando o mês de Abril chega a meio, quando os dias se “esticam” em tardes longas já armadas em soirées de Verão, quando se aproximam os dias vinte, começa a cheirar a festas de São Marcos na minha terra natal adoptiva, Santo António das Areias. Esta realidade não será certamente muito diferente da que se verifica por essas terras do distrito e do país fora quando chega à altura do ano em que tempo é de homenagear o padroeiro ou a santinha da devoção.
Nestes tempos de São Marcos dei por mim a pensar em contingências / trivialidades que só dão mesmo vontade de desabafar…
Não querendo ser pessimista nem desolador, não querendo voltar a tocar na ferida a despropósito, não consigo evitar partilhar convosco a tristeza que me invade ao ser testemunha ocular da morte do interior e de todo um modo de vida. Por mais que digamos que não, que pode ser que a coisa mude, que a esperança é a última a morrer… pouco ou nada há a fazer para evitar o inevitável, e dói mesmo muito. Ao olharmos em volta, vemos que as pessoas são cada vez menos, cada vez mais idosas, a viver com cada vez mais dificuldades e ou acontece um milagre aqui e agora e já, ou o desfecho está bom de se ver. Já não me lembro do tempo em que a festa de São Marcos tinha um cunho marcadamente agrícola e rural, em que se benziam os animais e se pedia à divindade que protegesse campos e culturas, sementeiras e criações. Não sou desse tempo mas lembro-me bem quando era miúdo, de ver por aqui nestas alturas, muitas, muitas barracas e diversões que só nos visitavam precisamente a razão desta efeméride. Havia carros de choque e carróceis, barraquinhas de tiro ao alvo e ginjinha, muita pipoca e algodão doce e até o jogo da derruba das latas de refrigerantes com as meias cosidas, que qualquer um de nós podia recriar quando quisesse em casa, mas tinha ali outra magia, capaz de sacar um sorriso irónico da loura platinada que servia de assistente ao ver uma carambola bem medida. De ano para ano, vêm cada vez menos feirantes, cada vez mais tímidos e encolhidos, a queixarem-se que aquele já foi chão que deu uvas. A coisa chegou a tal ponto que se abalasse a roulotte das bifanas, se partisse a meia dúzia de marroquinos com tecnologia made in loja do chinês e se tirássemos as luzes da Praça, nem parecia que vivíamos a festa maior da maior das localidades do concelho em termos populacionais.
Mas em tempos de São Marcos percebi também que nem tudo é mau, que ainda há pessoas capazes de desinteressadamente se reunirem e trabalharem por um objectivo comum, pessoas que sem terem a certeza de um retorno imediato se dedicam a causas em que acreditam, deixam família e ócio para trás, ficam a dever muitas horas de sono à cama e batem o pé quando é preciso para organizarem um bom bailarico, um torneio de malha, um convívio de tiro ao prato ou mesmo uma bela tourada à antiga portuguesa capaz de encher a nossa praça outra vez e que bonita que estava!
Nestes dias de São Marcos em que a palavra de ordem é, mais que viver, conviver, nestes dias em que saímos de casa e procuramos uns pelos outros, confirmei a minha teoria que esta invenção do euro é uma espécie de doença de laboratório que os economistas das europas inventaram para nos explorarem um bocadinho mais. Ai que saudadinhas dos meus escudos… Como diziam as senhoras do anúncio, eu ainda sou do tempo em que quando se andava com uma notita de quinhentos no bolso, estava-se mais que garantido e até dava para assobiar e agora, com os arredondamentos mais que mágicos é ver as de 20, as de 10 e as de 5 a voarem do bolso para fora para nunca mais voltarem. E não me amolem nem me venham chamar retrógrado e antiquado porque com cafés a 140 paus e toda a gente bem disposta, não há bolsa nem conversão que resista.
Nestes dias em que se sai mais e se vê menos televisão, reparei que o mundo está cada vez mais parecido com as novelas brasileiras querendo eu dizer com isto que mesmo que se falhem 10 episódios, não há qualquer risco de perder o fio à meada porque gira o disco e toca o mesmo! Em 5 minutos de um noticiário de relance enquanto se mastiga qualquer coisa, vêm-se massacres desvairados nos Estados Unidos (que se auto-intitulam os mais civilizados do mundo e onde só não anda de pistola à cintura quem não quer!); lutas fratricidas na facção mais há direita da nossa direita política, caças ao skins por cá e aos votos em França, mortes, bombas e destruição, a cabeça do Fernando Santos numa bandeja; a campanha quase colonialista do Alberto João e uma ou outra variedade no final para terminar com um espírito bem disposto como convém.
Nestes dias fui também a Espanha em missão profissional com um amigo que por lá viveu e os conhece como ninguém e fiquei com vontade de emigrar quando me explicou a forma como os hermanos organizam os seus dias. Começam a jornada de trabalho às nossas 8 da manhã e largam à nossa uma para retomarem apenas no dia seguinte. Quando saem do serviço não dispensam o copo e o petisco de convívio com os amigos e colegas de trabalho, almoçam às duas da tarde… e depois? Depois nunca falham a famosa siesta e no resto do dia? Pergunto eu. No resto do dia? Vivem, que é o que nós tantas vezes nos esquecemos de fazer! Fazem o que lhe der la gana e quando trabalham, trabalham a sério porque só assim se explica os índices de produtividade e rendimento que fazem de Espanha uma das grandes potências da Europa, deixando-nos tantas vezes a tossir na poeira do seu rasto.
Nestes dias de São Marcos e enquanto regressava embrulhado nestas minhas conjecturas, olhei para o cartaz das festas e para o grande baile de terça-feira, animado por uma óbvia orquestra espanhola e dei por mim a pensar se as politicamente incorrectas sovas que o nosso bravo Afonso Henriques espetou na mãezinha ao tempo da fundação da nacionalidade não teriam sido mais que a despropósito. Pelo menos nós aqui na Raia, safávamo-nos bem melhor com uma copla bem animada que com um faduncho entristecido daqueles que não é capaz de animar ninguém. A ver vamos o que isto ainda dá!

Quando o mês de Abril chega a meio, quando os dias se “esticam” em tardes longas já armadas em soirées de Verão, quando se aproximam os dias vinte, começa a cheirar a festas de São Marcos na minha terra natal adoptiva, Santo António das Areias. Esta realidade não será certamente muito diferente da que se verifica por essas terras do distrito e do país fora quando chega à altura do ano em que tempo é de homenagear o padroeiro ou a santinha da devoção.
Nestes tempos de São Marcos dei por mim a pensar em contingências / trivialidades que só dão mesmo vontade de desabafar…
Não querendo ser pessimista nem desolador, não querendo voltar a tocar na ferida a despropósito, não consigo evitar partilhar convosco a tristeza que me invade ao ser testemunha ocular da morte do interior e de todo um modo de vida. Por mais que digamos que não, que pode ser que a coisa mude, que a esperança é a última a morrer… pouco ou nada há a fazer para evitar o inevitável, e dói mesmo muito. Ao olharmos em volta, vemos que as pessoas são cada vez menos, cada vez mais idosas, a viver com cada vez mais dificuldades e ou acontece um milagre aqui e agora e já, ou o desfecho está bom de se ver. Já não me lembro do tempo em que a festa de São Marcos tinha um cunho marcadamente agrícola e rural, em que se benziam os animais e se pedia à divindade que protegesse campos e culturas, sementeiras e criações. Não sou desse tempo mas lembro-me bem quando era miúdo, de ver por aqui nestas alturas, muitas, muitas barracas e diversões que só nos visitavam precisamente a razão desta efeméride. Havia carros de choque e carróceis, barraquinhas de tiro ao alvo e ginjinha, muita pipoca e algodão doce e até o jogo da derruba das latas de refrigerantes com as meias cosidas, que qualquer um de nós podia recriar quando quisesse em casa, mas tinha ali outra magia, capaz de sacar um sorriso irónico da loura platinada que servia de assistente ao ver uma carambola bem medida. De ano para ano, vêm cada vez menos feirantes, cada vez mais tímidos e encolhidos, a queixarem-se que aquele já foi chão que deu uvas. A coisa chegou a tal ponto que se abalasse a roulotte das bifanas, se partisse a meia dúzia de marroquinos com tecnologia made in loja do chinês e se tirássemos as luzes da Praça, nem parecia que vivíamos a festa maior da maior das localidades do concelho em termos populacionais.
Mas em tempos de São Marcos percebi também que nem tudo é mau, que ainda há pessoas capazes de desinteressadamente se reunirem e trabalharem por um objectivo comum, pessoas que sem terem a certeza de um retorno imediato se dedicam a causas em que acreditam, deixam família e ócio para trás, ficam a dever muitas horas de sono à cama e batem o pé quando é preciso para organizarem um bom bailarico, um torneio de malha, um convívio de tiro ao prato ou mesmo uma bela tourada à antiga portuguesa capaz de encher a nossa praça outra vez e que bonita que estava!
Nestes dias de São Marcos em que a palavra de ordem é, mais que viver, conviver, nestes dias em que saímos de casa e procuramos uns pelos outros, confirmei a minha teoria que esta invenção do euro é uma espécie de doença de laboratório que os economistas das europas inventaram para nos explorarem um bocadinho mais. Ai que saudadinhas dos meus escudos… Como diziam as senhoras do anúncio, eu ainda sou do tempo em que quando se andava com uma notita de quinhentos no bolso, estava-se mais que garantido e até dava para assobiar e agora, com os arredondamentos mais que mágicos é ver as de 20, as de 10 e as de 5 a voarem do bolso para fora para nunca mais voltarem. E não me amolem nem me venham chamar retrógrado e antiquado porque com cafés a 140 paus e toda a gente bem disposta, não há bolsa nem conversão que resista.
Nestes dias em que se sai mais e se vê menos televisão, reparei que o mundo está cada vez mais parecido com as novelas brasileiras querendo eu dizer com isto que mesmo que se falhem 10 episódios, não há qualquer risco de perder o fio à meada porque gira o disco e toca o mesmo! Em 5 minutos de um noticiário de relance enquanto se mastiga qualquer coisa, vêm-se massacres desvairados nos Estados Unidos (que se auto-intitulam os mais civilizados do mundo e onde só não anda de pistola à cintura quem não quer!); lutas fratricidas na facção mais há direita da nossa direita política, caças ao skins por cá e aos votos em França, mortes, bombas e destruição, a cabeça do Fernando Santos numa bandeja; a campanha quase colonialista do Alberto João e uma ou outra variedade no final para terminar com um espírito bem disposto como convém.
Nestes dias fui também a Espanha em missão profissional com um amigo que por lá viveu e os conhece como ninguém e fiquei com vontade de emigrar quando me explicou a forma como os hermanos organizam os seus dias. Começam a jornada de trabalho às nossas 8 da manhã e largam à nossa uma para retomarem apenas no dia seguinte. Quando saem do serviço não dispensam o copo e o petisco de convívio com os amigos e colegas de trabalho, almoçam às duas da tarde… e depois? Depois nunca falham a famosa siesta e no resto do dia? Pergunto eu. No resto do dia? Vivem, que é o que nós tantas vezes nos esquecemos de fazer! Fazem o que lhe der la gana e quando trabalham, trabalham a sério porque só assim se explica os índices de produtividade e rendimento que fazem de Espanha uma das grandes potências da Europa, deixando-nos tantas vezes a tossir na poeira do seu rasto.
Nestes dias de São Marcos e enquanto regressava embrulhado nestas minhas conjecturas, olhei para o cartaz das festas e para o grande baile de terça-feira, animado por uma óbvia orquestra espanhola e dei por mim a pensar se as politicamente incorrectas sovas que o nosso bravo Afonso Henriques espetou na mãezinha ao tempo da fundação da nacionalidade não teriam sido mais que a despropósito. Pelo menos nós aqui na Raia, safávamo-nos bem melhor com uma copla bem animada que com um faduncho entristecido daqueles que não é capaz de animar ninguém. A ver vamos o que isto ainda dá!