13º Desabafo – 27 de Dezembro de 2006 – “Rescaldo Natalício”
Provando mais uma vez que o que o que é bom acaba depressa, lá se foi mais um Natal que como sempre, custou mais a chegar do que a abalar. De renas estacionadas na garagem do Pólo Norte, o nosso velhinho de vermelho já deve ter as barbas de molho, resfolgando na enorme poltrona junto à lareira, gozando entre os duendes o merecido descanso depois de dias tão atribulados para uma pessoa da sua idade.
Nós por cá, vivemos este curioso período que vai entre a quadra natalícia propriamente dita e a noite em que arrumamos na gaveta o ano velho e damos as boas vindos a um fresquinho, acabadinho de estrear. Meio mundo aproveita agora para gozar aquele restinho de férias que guardou no fundo do saco o ano inteiro, e os outros que supostamente deveriam estar a trabalhar, estão mas é já a ver-se de copo de champanhe na mão, dançando embalados pelas doze badaladas, pelo glamour do fogo de artifício e pela fantasia de uma noite especial em que nos sentimos todos mais blasés.
Neste espaço de tréguas e desintoxicação a que chamaria de “Advento do Ano Novo”, aproveitemos pois para recuperar os índices normais de vivência e para fazer uma análise do ano que passou. Eu, por exemplo, aproveito para deixar dois ou três pequenos desabafos sobre esta quadra que passou e que gostaria de partilhar convosco.
1. Os actuais fabricantes de brinquedos não gostam de crianças. Eu já suspeitava, mas este ano tirei completamente as dúvidas que me restavam. Antigamente, quem tinha o dom de construir brinquedos eram pessoas especiais que, tal como o Peter Pan, nunca perdiam aquela capacidade extraordinária de sonhar acordados que é tão própria das crianças. Eram pessoas divinamente dotadas que depositavam em cada peça que faziam, um amor que chegava por tabela ao feliz petiz que a recebia. Lembram-se da história do Pinóquio e do seu fabricante Gepeto, a quem o próprio chamava de pai? Dantes, os fabricantes de brinquedos eram assim. Agora, só pensam neles e no dinheiro que ganham, trabalham não para fazer os meninos e as meninas felizes, mas para engrossarem as chorudas contas bancárias e para aumentarem os impérios. Vejam se não concordam comigo: em primeiro lugar, começam por bombardear as manhãs dos nossos filhos, quase sem darmos por isso e logo que entra o Outono, com blocos maciços de publicidade que deixam os seus pequenos cérebros atordoados de desejo. A injecção de vontade que lhe espetam nos rabitos é de tal ordem, que em vez de tirar, dá uma terrível febre consumista que os deixa completamente desorientados, sem saber para onde se virar. Ao ponto de a minha me ter dito que “o Pai Natal enganou-se nas minhas prendas e não me trouxe nada daquilo que eu queria”. Quando confrontada por mim se as prendas que tinha recebido, uma a uma, não tinham sido por ela pedidas, pelo menos uma vez, respondeu-me que sim. Mas que queria também “a boneca não sei quantos, o carrinho para não sei quê, os autocolantes para colar não sei onde” e terminou a extensa lista com esta jóia: “e também não me deu muitos bonecos que eu queria e que agora não me consigo lembrar quais são”. Ai filha, tu agora não percebes, mas estás perdoada.
A principal razão que me leva a ser porta-voz desta cruzada contra esses infiéis fabricantes de brinquedos é o mistério das pilhas. Sim, a mítica questão das pilhas que só quem nunca foi pai não sabe do que vos falo. Esses infames construtores, nunca assistiram certamente à abertura, em plena noite de Natal, dos pacotes que fabricam em série mas a coisa até é fácil de explicar: os paizinhos trazem a prenda (se não houver quem se vista de Pai Natal…) e a criança destrói em fracções de segundos o frágil embrulho. Ao dar de caras com o presente, grita de alegria e abraça agradecida por ser “aquilo que sempre queria”. De seguida, vira-se para o pai e diz: “monta!”. E o pai que pode nem ser grande amante da bricolage, tem mesmo de meter mãos à obra e fazer de linha de montagem porque à mínima nega, é choro certo. Sob o olhar curioso e austero do descendente, dá voltas e voltas à caixa e às instruções, vira e revira, sua e inspecciona e quando finalmente tem tudo pronto, novo a estrear, faltam… as pilhas. As pilhas senhores! que são sempre do modelo e do tamanho que nós não temos, que nós já acabámos, que nós não sabíamos que existia. Furibundos, capazes de enforcar o Senhor Mattel ou o Senhor Famosa, temos de engolir em seco e reduzir-nos à nossa triste condição plebeia, com vontade de acompanhar os mais pequenos no seu lamento. Sei que a probabilidade de esses senhores estarem agora a ouvir-me é praticamente nula mais ainda assim, fica o registo para que saibam, estejam lá onde estiverem: para a próxima, vejam lá se metem as pilhas adequadas mesmo que o brinquedo custe mais um ou dois euros e não importa que sejam muito manhosas e aguentem apenas uma noite. Assim, sempre dá tempo para no dia seguinte irmos seja lá onde for preciso para arranjar as devidas recargas. A mim, nunca mais me enganam e no ano que vem, hei-de comprar um expositor da Duracell daqueles inteirinhos mesmo que abrase o subsídio de Natal todinho e que a minha casa tenha tanta electricidade que se torne radioactiva, ao ponto de nem precisar das luzinhas no telhado para brilhar na noite de Natal.
2. Quanto à questão ambiental, tenho que pedir desculpa mas para mim os ecologistas sempre foram uma espécie de talibans só que em vez do Maomé, têm a natureza. Acho-os sempre muito facciosos, muito redutores, muito fundamentalistas, muito controladores, muito sem razão apesar de saber que a têm toda. Não sei porquê, mas dei comigo a pensar que deve ser terrível estar casado com uma ecologista daquelas ferrenhas, sempre detrás de nós, a desligar-nos a torneira da água quando lavamos os dentes, a obrigar-nos a longos serões de conversa à luz de vela para não gastarmos electricidade, a obrigar-nos a comprar o tal carro amigo do ambiente em vez do que nós gostamos, a utilizar roupa que respeita o não sei quê, a cumprir mil e uma regras ambientais capazes de levar à loucura o militar que há em nós. Tudo isto apesar de ser um primeiros sócios da maior associação ambiental portuguesa, a Quercus, facto que se deveu mais a uma feliz coincidência do destino que me levou a privar em tempos com um dos fundadores, do que a qualquer outro fervor proteccionista. A forma ferrenha como vivem faz-me um bocadinho de impressão mas tenho notado em mim, gradualmente, um aumento do respeito por certas e determinadas medidas que a nós não nos custam quase nada e que podem ser decisivas para o futuro do planeta. Aquela conversa da terra que vamos deixar para os nossos filhos e os nossos netos, o legado para as gerações vindouras, deixa-me sempre a tremer de remorsos. Vem tudo isto a propósito dos montes de lixo colocado indiscriminadamente junto dos contentores nesta época natalícia, da oportuna transmissão na SIC do filme “O dia depois de amanhã” no qual um abrupto aquecimento global mergulha o planeta numa súbita segunda Idade do Gelo, e da nomeação de Al Gore, mais conhecido por ter sido o braço direito de Clinton, por ter sido o Presidente dos EUA que os poderosos Bush roubaram e nunca o chegou a ser de facto, como a figura internacional do ano de 2006 para inúmeras publicações de referência de todo o mundo, pela oportunidade do seu documentário “Uma verdade inconveniente” onde alerta para a necessidade de zelarmos cada vez mais e melhor pelo nosso planeta, gravemente enfermo, vítima de inúmeras atentados e do desmazelo geral. Reparei em algumas entrevistas de rua que passaram nos noticiários deste dias, nos jovens petizes que brincavam ou passeavam à beira-rio na capital, desfrutando pela primeira vez dos seus presentes, que confessaram que isso de separar o papel e o cartão, do plástico e do resto do lixo diverso era coisa de ficção científica e portanto, sem aplicação nos seus domicílios. É pena porque com um pouco de esforço de cada um, se todos nós fizermos o que está ao nosso alcance, muito pode representar para o nosso ambiente. Experimentem que vão ver que se sentem bem melhor ajudando.
3. Sem me querer armar em Professor Marcelo da província, deixo uma última nota para a programação televisiva no Natal em que se destacou de longe, a 2:, que será sempre o segundo canal, cada vez mais excelente e oportuno com belíssimos espectáculos de circo para todas as idades, grandiosos documentários, supremos espectáculos e uma rica programação bem adequada à época, brilhando como um diamante na lama sobre o lixo geral que reina nos seus congéneres, elevando-se acima de tenebrosas Floribellas, Morangos, Fugitivas, concursos manhosos de canto e dança, imediatismo e mediocridade. Que bom é às vezes ser-se diferente!
Um abraço a todos e até 2007! Que tenham um Feliz Ano Novo com tudo o que mais desejam!
Provando mais uma vez que o que o que é bom acaba depressa, lá se foi mais um Natal que como sempre, custou mais a chegar do que a abalar. De renas estacionadas na garagem do Pólo Norte, o nosso velhinho de vermelho já deve ter as barbas de molho, resfolgando na enorme poltrona junto à lareira, gozando entre os duendes o merecido descanso depois de dias tão atribulados para uma pessoa da sua idade.
Nós por cá, vivemos este curioso período que vai entre a quadra natalícia propriamente dita e a noite em que arrumamos na gaveta o ano velho e damos as boas vindos a um fresquinho, acabadinho de estrear. Meio mundo aproveita agora para gozar aquele restinho de férias que guardou no fundo do saco o ano inteiro, e os outros que supostamente deveriam estar a trabalhar, estão mas é já a ver-se de copo de champanhe na mão, dançando embalados pelas doze badaladas, pelo glamour do fogo de artifício e pela fantasia de uma noite especial em que nos sentimos todos mais blasés.
Neste espaço de tréguas e desintoxicação a que chamaria de “Advento do Ano Novo”, aproveitemos pois para recuperar os índices normais de vivência e para fazer uma análise do ano que passou. Eu, por exemplo, aproveito para deixar dois ou três pequenos desabafos sobre esta quadra que passou e que gostaria de partilhar convosco.
1. Os actuais fabricantes de brinquedos não gostam de crianças. Eu já suspeitava, mas este ano tirei completamente as dúvidas que me restavam. Antigamente, quem tinha o dom de construir brinquedos eram pessoas especiais que, tal como o Peter Pan, nunca perdiam aquela capacidade extraordinária de sonhar acordados que é tão própria das crianças. Eram pessoas divinamente dotadas que depositavam em cada peça que faziam, um amor que chegava por tabela ao feliz petiz que a recebia. Lembram-se da história do Pinóquio e do seu fabricante Gepeto, a quem o próprio chamava de pai? Dantes, os fabricantes de brinquedos eram assim. Agora, só pensam neles e no dinheiro que ganham, trabalham não para fazer os meninos e as meninas felizes, mas para engrossarem as chorudas contas bancárias e para aumentarem os impérios. Vejam se não concordam comigo: em primeiro lugar, começam por bombardear as manhãs dos nossos filhos, quase sem darmos por isso e logo que entra o Outono, com blocos maciços de publicidade que deixam os seus pequenos cérebros atordoados de desejo. A injecção de vontade que lhe espetam nos rabitos é de tal ordem, que em vez de tirar, dá uma terrível febre consumista que os deixa completamente desorientados, sem saber para onde se virar. Ao ponto de a minha me ter dito que “o Pai Natal enganou-se nas minhas prendas e não me trouxe nada daquilo que eu queria”. Quando confrontada por mim se as prendas que tinha recebido, uma a uma, não tinham sido por ela pedidas, pelo menos uma vez, respondeu-me que sim. Mas que queria também “a boneca não sei quantos, o carrinho para não sei quê, os autocolantes para colar não sei onde” e terminou a extensa lista com esta jóia: “e também não me deu muitos bonecos que eu queria e que agora não me consigo lembrar quais são”. Ai filha, tu agora não percebes, mas estás perdoada.
A principal razão que me leva a ser porta-voz desta cruzada contra esses infiéis fabricantes de brinquedos é o mistério das pilhas. Sim, a mítica questão das pilhas que só quem nunca foi pai não sabe do que vos falo. Esses infames construtores, nunca assistiram certamente à abertura, em plena noite de Natal, dos pacotes que fabricam em série mas a coisa até é fácil de explicar: os paizinhos trazem a prenda (se não houver quem se vista de Pai Natal…) e a criança destrói em fracções de segundos o frágil embrulho. Ao dar de caras com o presente, grita de alegria e abraça agradecida por ser “aquilo que sempre queria”. De seguida, vira-se para o pai e diz: “monta!”. E o pai que pode nem ser grande amante da bricolage, tem mesmo de meter mãos à obra e fazer de linha de montagem porque à mínima nega, é choro certo. Sob o olhar curioso e austero do descendente, dá voltas e voltas à caixa e às instruções, vira e revira, sua e inspecciona e quando finalmente tem tudo pronto, novo a estrear, faltam… as pilhas. As pilhas senhores! que são sempre do modelo e do tamanho que nós não temos, que nós já acabámos, que nós não sabíamos que existia. Furibundos, capazes de enforcar o Senhor Mattel ou o Senhor Famosa, temos de engolir em seco e reduzir-nos à nossa triste condição plebeia, com vontade de acompanhar os mais pequenos no seu lamento. Sei que a probabilidade de esses senhores estarem agora a ouvir-me é praticamente nula mais ainda assim, fica o registo para que saibam, estejam lá onde estiverem: para a próxima, vejam lá se metem as pilhas adequadas mesmo que o brinquedo custe mais um ou dois euros e não importa que sejam muito manhosas e aguentem apenas uma noite. Assim, sempre dá tempo para no dia seguinte irmos seja lá onde for preciso para arranjar as devidas recargas. A mim, nunca mais me enganam e no ano que vem, hei-de comprar um expositor da Duracell daqueles inteirinhos mesmo que abrase o subsídio de Natal todinho e que a minha casa tenha tanta electricidade que se torne radioactiva, ao ponto de nem precisar das luzinhas no telhado para brilhar na noite de Natal.
2. Quanto à questão ambiental, tenho que pedir desculpa mas para mim os ecologistas sempre foram uma espécie de talibans só que em vez do Maomé, têm a natureza. Acho-os sempre muito facciosos, muito redutores, muito fundamentalistas, muito controladores, muito sem razão apesar de saber que a têm toda. Não sei porquê, mas dei comigo a pensar que deve ser terrível estar casado com uma ecologista daquelas ferrenhas, sempre detrás de nós, a desligar-nos a torneira da água quando lavamos os dentes, a obrigar-nos a longos serões de conversa à luz de vela para não gastarmos electricidade, a obrigar-nos a comprar o tal carro amigo do ambiente em vez do que nós gostamos, a utilizar roupa que respeita o não sei quê, a cumprir mil e uma regras ambientais capazes de levar à loucura o militar que há em nós. Tudo isto apesar de ser um primeiros sócios da maior associação ambiental portuguesa, a Quercus, facto que se deveu mais a uma feliz coincidência do destino que me levou a privar em tempos com um dos fundadores, do que a qualquer outro fervor proteccionista. A forma ferrenha como vivem faz-me um bocadinho de impressão mas tenho notado em mim, gradualmente, um aumento do respeito por certas e determinadas medidas que a nós não nos custam quase nada e que podem ser decisivas para o futuro do planeta. Aquela conversa da terra que vamos deixar para os nossos filhos e os nossos netos, o legado para as gerações vindouras, deixa-me sempre a tremer de remorsos. Vem tudo isto a propósito dos montes de lixo colocado indiscriminadamente junto dos contentores nesta época natalícia, da oportuna transmissão na SIC do filme “O dia depois de amanhã” no qual um abrupto aquecimento global mergulha o planeta numa súbita segunda Idade do Gelo, e da nomeação de Al Gore, mais conhecido por ter sido o braço direito de Clinton, por ter sido o Presidente dos EUA que os poderosos Bush roubaram e nunca o chegou a ser de facto, como a figura internacional do ano de 2006 para inúmeras publicações de referência de todo o mundo, pela oportunidade do seu documentário “Uma verdade inconveniente” onde alerta para a necessidade de zelarmos cada vez mais e melhor pelo nosso planeta, gravemente enfermo, vítima de inúmeras atentados e do desmazelo geral. Reparei em algumas entrevistas de rua que passaram nos noticiários deste dias, nos jovens petizes que brincavam ou passeavam à beira-rio na capital, desfrutando pela primeira vez dos seus presentes, que confessaram que isso de separar o papel e o cartão, do plástico e do resto do lixo diverso era coisa de ficção científica e portanto, sem aplicação nos seus domicílios. É pena porque com um pouco de esforço de cada um, se todos nós fizermos o que está ao nosso alcance, muito pode representar para o nosso ambiente. Experimentem que vão ver que se sentem bem melhor ajudando.
3. Sem me querer armar em Professor Marcelo da província, deixo uma última nota para a programação televisiva no Natal em que se destacou de longe, a 2:, que será sempre o segundo canal, cada vez mais excelente e oportuno com belíssimos espectáculos de circo para todas as idades, grandiosos documentários, supremos espectáculos e uma rica programação bem adequada à época, brilhando como um diamante na lama sobre o lixo geral que reina nos seus congéneres, elevando-se acima de tenebrosas Floribellas, Morangos, Fugitivas, concursos manhosos de canto e dança, imediatismo e mediocridade. Que bom é às vezes ser-se diferente!
Um abraço a todos e até 2007! Que tenham um Feliz Ano Novo com tudo o que mais desejam!
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